O Casino de Armação de Pêra- Um possível ponto de partida para repensar a vila?


No ano do quinquagésimo aniversário da inauguração do edifício do antigo casino de Armação de Pêra deparamo-nos com uma situação que se pode considerar delicada, pelo estado em que se encontra o imóvel. Mas antes de tudo começo com uma breve contextualização histórica que aponta algumas situações que condicionaram a construção do casino e outros equipamentos turísticos. Portugal para além de encantar os seus visitantes desde há séculos, quer pelas suas condições climatéricas como pela sua beleza e riqueza natural e cultural, assumiu durante o período da II Grande Guerra um interessante papel a nível internacional, pois apesar da sua posição neutral, foi teatro de muitas movimentações, desde espionagem, ponto de passagem de refugiados e exilados para o outro lado do Atlântico, palco de negociações, entre muitos outros factores, o que levou a que inúmeros visitantes estrangeiros permanecessem no país nem que fosse temporariamente. Já após a guerra apesar do país se manter algo fechado ao exterior, chegando mesmo a recusar ajudas de fomento económico vindas de fora, deu-se um crescente interesse turístico, obrigando o governo a “ceder” um pouco aos assédios vindos de outros países. O órgão de propaganda e informação do governo de Salazar, primeiro Secretariado de Propaganda Nacional, mais tarde Secretariado Nacional de Informação, Turismo e Cultura Popular, numa política de passar uma imagem dum Portugal mais positivo e turístico desafiou vários artistas de nomeada a nível nacional a elaborar cartazes e anúncios turísticos que frisassem os aspectos mais marcantes das várias regiões do país. Outra das maneiras de tornar o Portugal governado por Salazar atractivo aos olhos de turistas estrangeiros passava por convidar grandes nomes da cultura europeia e mundial a desfrutar de uns dias no país, anunciando depois na imprensa que determinada personalidade tinha passado férias cá, claro está que vários convites foram recusados por parte de pessoas informadas e que se opunham ao regime vigente.

É neste ambiente que surgem vários programas para dotar algumas regiões de equipamentos capazes de albergar e entreter os turistas endinheirados, estando, claro está, incluídos casinos na orla litoral. Armação de Pêra foi uma das localidades em que foi criado um novo edifício para albergar um casino moderno e atraente aos turistas, assim como uma série de obras de beneficiação para tornar a povoação mais visitável e acolhedora ao visitante.

Inaugurado em 1958 o edifício do casino de Armação de Pêra, possuía uma arquitectura que o distinguia dos demais edifícios da localidade, estando numa localização privilegiada, dominando a vista sobre a praia, com uma “varanda” aberta para o mar, este também possivelmente bastante visível do interior, pois o prédio aparenta ter estado dotado de uma ampla superfície vidrada voltada ao Oceano, da qual ainda se conserva um troço, estando actualmente grande parte entaipado. A rigidez e solenidade da fachada que dá para a avenida é o contraponto da dinâmica e curva parede que se encontra voltada para a praia, o espaço exterior como atrás referi oferecia também uma vista privilegiada para a baía.

Passando de novo para o presente, é de lamentar o estado em que o edifício e a sua envolvente se encontram, oferecendo poucas condições para os eventos que lá se realizam e também para o posto de turismo, este último com obras agendadas pela RTA, que espero que valorizem a arquitectura original do edifício e não contribuam mais para a sua descaracterização. A “frente marítima” está basicamente ao abandono e com um aspecto de degradação nada convidativo.

Se houvesse um projecto/programa de valorização deste imóvel bem estruturado numa perspectiva de trazer novos e melhores conteúdos à vila, que incluíssem uma recuperação geral do edifício poderia, quem sabe, ser um primeiro passo para a revitalização cultural de Armação de Pêra, cuja oferta cultural é praticamente inexistente apesar da afluência de vários milhares de turistas todos os anos. Aquele “miradouro” poderia, por exemplo, ser facilmente convertido num dos espaços mais agradáveis da vila, como certamente o foi no passado, podendo-se realizar performances artísticas e actuações ao vivo, ou simplesmente para ser usado numa contemplação da orla marítima, mas num ambiente com qualidade. A intervenção e valorização do antigo casino podia, uma vez mais, ser o primeiro passo para repensar Armação de Pêra, pois a fórmula “Sol e Praia” está esgotada e os turistas, cada vez mais exigentes, procuram novos conteúdos culturais e uma oferta de qualidade. A transformação deste edifício num “centro cultural” de Armação de Pêra seria uma aposta interessante e que traria benefícios a todos, edifício incluído.

Comentários

Manuel Ramos disse…
Caro Marco,
Falar em antigo casino talvez não seja a adjectivação mais apropriada, já que este, o de 1958,é o novo Casino de Armação (o do Estado Novo). O primeiro, que desconheço onde funcionava, é da iniciativa do incontornável Gregório Mascarenhas, ainda durante a 1ª República, logo na segunda década do séc. XX. Feito este pequeno reparo, serve o comentário para dizer da minha concordância com o que diz e da minha indignação pelo facto de um edifício com aquela localização e características estar como está! Nem o facto de lá ter trabalhado um GAT pró-Armação após as críticas à situação urbanística da vila feitas pelo ex-presidente Jorge Sampaio lhe valeu de muito.
Nem as promessas deste executivo, a recordar, porque já algo datadas e, discutíveis(2005):
http://www.barlavento.online.pt/index.php/noticia?id=291
Exacto Manuel, aceito o reparo, pois eu também hesitei um pouco, precisamente por saber que houve um casino anterior a este, mas no final lá resolvi utilizar esta terminologia. Ao que sei, através da toponímia, o antigo casino localizava-se numa das transversais a esta marginal, já depois da igreja e do chalet dos Caldas e Vasconcelos se não estou em erro.

Abraço
Marco
Unknown disse…
Habituei-me a ligar Algarve a Armação, pois foi para lá que mais vezes fui e é lá que me consigo sentir em casa... ainda agora daí vim. Armação era uma 'prainha' muito acolhedora, uma terra pequena no meio dos gigantes como Albufeira e Portimão. Agora arrisco-me a dizer que triplicou de tamanho no espaço de dez anos... a 'dorsal' é o novo axis mundis de Armação e está num local que era deserto. A torre de elevação de água estava no meio de nenhures e agora está ali, no meio de tudo... Apesar desta nova zona de Armação estar bonita e - do ponto de vista de alguém que aí passa uns dias de vez em quando - relativamente bem organizada (bastante mais bonita que a zona 'antiga' que é caótica), parece que está a perder aquilo que fazia dela a praia que eu tanto gostava.
A frente marítima é que me parece que está ao abandono... não basta ter mar e uma bela praia para ter uma frente marítima decente. O parque ao pé do minigolfe já precisava de uma intervençãozinha, um restauro... e o minigolfe tb (não sei se é privado ou arrendado pela autarquia a quem lá tem o café). É um espaço que precisa de um pouco de atenção porque, tirando a zona da fortaleza, é o único espaço 'público' de convívio da frente marítima em Armação... Depois o Casino... a sua recuperação permitia criar um espaço 'intermédio' entre os dois já referidos... A quem pertence ele actualmente? Bem recuperado permitia ali criar um belíssimo café concerto ou um espaço similar... uma esplanada com uns livrinhos para o pessoal dar uma vista de olhos e ao lado uma livraria onde os comprar (a feira do livro já lá está!!!)... A cultura não tem que ser incompreensível e intangível... não tem que ser complicada, não tem que ser só teatro ou ópera... um espaço de cultura poderá ter uma roupagem de espaço de convívio... Armação merece mais que massificação, merece qualidade.
Força aí neste tu blog rapaz...
Muito obrigado pelo comentário André! Veio complementar alguns aspectos que não referi convenientemente e mostra um testemunho emotivo de quem acompanhou de perto este "crescimento" de Armação de Pêra. Obrigado também pelo incentivo.

Abraço
Anónimo disse…
Saudações
Sei que pode parecer, geograficamente, um pouco deslocado este assunto mas como se trata de património, não posso deixar de chamar a atenção aos potenciais interessados: Estão a destruir o património em Tomar. De uma forma inconcebível. Ver: http://ponto4.blogspot.com/2008/08/inacreditvel.html
ou
https://www.blogger.com/comment.g?blogID=37959929&postID=949372897043098942
ou ainda
http://www.youtube.com/watch?v=7T8MpScU1mY

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