Outras Viagens, Outros Olhares – O Turismo no Algarve
EXPOSIÇÃO “ALGARVE – DO REINO À REGIÃO”
Outras Viagens, Outros Olhares – O Turismo no Algarve
Marco A. Santos (CEPHA/UAlg)
A exposição Outras Viagens, Outros Olhares, inserida no projecto “Algarve - Do Reino à Região” da Rede de Museus do Algarve, patente no Museu Municipal de Arqueologia de Albufeira até ao final do ano, baseia-se essencialmente em testemunhos de vários autores sobre o Algarve, procurando traçar um retrato do turismo da região desde o século XIX até finais do século XX. O período contemplado acompanha uma época de grandes transições políticas no nosso país: a verificada do governo monárquico para o republicano e deste para o regime autoritário que permaneceu até 1974, sem que, no entanto, se façam grandes alusões políticas ou da influência de carácter politico na actividade turística e sua evolução na região algarvia. Uma ascensão observável desde as viagens oficiais e científicas dos séculos anteriores ao verdadeiro turismo de lazer que se afirmou fortemente no pós - II Grande Guerra, especialmente a partir dos anos 60, por outras palavras: o trajecto percorrido desde o Algarve rural e piscatório, quase inacessível (dada a fraca qualidade e cobertura dos meios de comunicação terrestres descritos no século XIX e inícios do XX) até ao ambiente quase cosmopolita que se verificou a partir da década de 60, onde pontificavam as visitas e estadias de celebridades nacionais e internacionais que a exposição trata de frisar.
O fascínio exercido por locais como Monchique, Praia da Rocha e Sagres/Cabo de São Vicente são tidos como a génese do interesse pelo Algarve e, de facto, estes lugares fizeram afluir à região considerável número de forasteiros, de curiosos a investigadores. A titulo de exemplo, pode-se mencionar Hermann Friedrich J. F. Von Maltzan, responsável por uma obra sobre o Cabo de São Vicente e a sua visita ao Reino do Algarve, ou Charles Bonnet (não referido nesta mostra, autor de Algarve, Description Geógraphique et Géologique de Cette Province), que nos últimos dois séculos foram “descobrindo” e divulgando diversos locais de interesse. Por outro lado, o desenvolvimento das indústrias, sobretudo a conserveira e a corticeira, trouxeram também empresários experientes, com iniciativa e que viram no crescente turismo um potencial económico a não desperdiçar. Caso de Caetano Feu ao apostar na criação do Casino da Praia da Rocha, um tipo de infra-estrutura que se tornou recorrente. Ao longo das décadas foram surgindo outros, como o de Monte Gordo em 1933, cujo projecto arquitectónico original foi da autoria de Luís Cristino da Silva, ou mesmo o de Armação de Pêra que viu o seu espaço de jogos e entretenimento aparecer em 1958.
A complementar os painéis expositivos encontra-se em vitrinas um pequeno acervo documental, constituído por obras de carácter turístico, fotografias de época, actas e planos autárquicos de actividade turística e também programas do Cinepax em Albufeira. Deste conjunto destaca-se a publicação Algarve, datada de 1947, com capa ilustrada pela artista Maria Keil e texto, em inglês, de Alexander H. Stuart, editada pelo Secretariado Nacional de Informação, Turismo e Cultura Popular (SNI), órgão oficial responsável pelo turismo e divulgação de Portugal no estrangeiro durante o período correspondente ao Estado Novo.
O vídeo com testemunhos sobre o Algarve durante as últimas décadas, cujos relatos de Lídia Jorge, Marcelo Rebelo de Sousa, Nuno Aires e Romero Magalhães traçam de forma interessante as mudanças que têm ocorrido na região revela-se útil à compreensão dos restantes conteúdos expositivos. O recurso ao arquivo de imagens da RTP mostrou-se uma mais valia para esta pequena realização, onde o cariz etnográfico de muitas dessas imagens recupera memórias de actividades e paisagens agora fortemente descaracterizadas, dando-as a conhecer aos turistas de hoje.
Para finalizar, queria apenas tocar alguns pontos que julgo fundamentais, mas que vimos descurados nesta exposição, falo por exemplo da notória falta de ligação entre o que nos é apresentado e a(s) realidade(s) sociopolítica(s) que o país atravessou no período focado, ainda que o vídeo consiga colmatar de forma singela essa lacunas.
A parca referência a instituições e infra-estruturas que se revelaram de maior importância para o aumento do fluxo turístico neste período de tempo, como o já falado SNI (a nível institucional) e as suas publicações, das quais se pode destacar a revista Panorama, ou a criação em Albufeira de uma colónia da FNAT (Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho, cuja inspiração é proveniente dos modelos italiano e alemão, o primeiro conhecido como Dopolavoro e o germânico como Kraft durch Freude ). Exemplos de outras estruturas não referidas, ou que surgiram na exposição de forma muito sintética, mas que desenharam (também) o quadro do Algarve turístico actual, são o importante Aeroporto Internacional de Faro inaugurado em 1965, possibilitando a aproximação da região a muitos pontos do globo; a chegada nos anos 70 da actual estrada IC1 ao Algarve, potenciando o movimento do turismo doméstico; ou o surgimento de aldeamentos, como o pioneiro projecto de Victor Palla para a Aldeia das Açoteias no concelho de Albufeira. Factores que devem ser tidos em consideração no estudo desta temática, assumindo a devida importância num evento do género. No entanto, apesar de algumas lacunas, torna-se interessante visitar Outras Viagens, Outros Olhares, sobretudo se a entendermos como uma primeira abordagem ao tema do Algarve enquanto região turística, podendo ser atractiva para um largo público, “os algarvios” e os turistas e viajantes da actualidade.
De salientar ainda o horário de Verão, de 3ª feira a Domingo entre as 18h e as 24h, perfeitamente adequado a um tempo de férias.
Comentários