Hotel Garbe – Algumas considerações.


Tal como o já aqui tratado casino de Armação de Pêra, o Hotel Garbe, inaugurado poucos anos depois (1961), surge como resposta à necessidade de alojar a crescente massa turística que começou a afluir à pequena localidade piscatória, certamente interessada pela beleza e extensão da praia e pelo ambiente pitoresco do ainda pequeno núcleo urbano e suas gentes.

Citando a investigadora Susana Lobo (Lobo, 2007), “ O turismo de massas, e com ele o turista, ganha expressão apenas a partir do pós II Guerra Mundial, com a real generalização das férias às classes trabalhadoras, possível no quadro de recuperação económica europeia do pós-guerra, pela disponibilização de frotas aéreas excedentárias para exploração comercial. O «sul» ganha um renovado fascínio e a trilogia Sun, sand & sea passa a estar ao alcance de todos, em pacotes de férias organizados. Surgem novos empreendimentos turísticos, moldados pela crescente pressão urbanística sobre o litoral, abrindo a oportunidade de se explorarem diferentes conceitos no planeamento de núcleos de veraneio.”.

É neste contexto que se verifica a crescente necessidade de construção de uma estrutura hoteleira de alguma dimensão que respondesse às carências, mas que não deixasse uma grande ferida aberta, tanto a nível de uma ruptura com o tecido urbano de Armação de Pêra, marca a diferença mas não é chocante, nem sobre a falésia onde se desenvolve, num modo que também não é dos mais agressivos, quando comparado com outras construções que se verificam por este Algarve fora.

Debrucemo-nos agora um pouco sobre a obra, os dados que reúno apresentam o período entre 1959 e 1962 para a realização do projecto efectuado pela dupla de arquitectos Jorge Ferreira Chaves e Frederico Sant’Ana e surge como um dos empreendimentos pioneiros da indústria hoteleira no Algarve, que José Manuel Fernandes bem intitula esta e alguns destes projectos da primeira vaga hoteleira no Algarve de “ Obras de escala acertada, volumetrias imaginativas e procurando uma integração local, e com um desenho moderno sem concessões ao “típico”, ao “folclórico” ou ao “decorativo”.” (Fernandes e Janeiro, 2005).

Como tal é necessário livrar alguns destes equipamentos do estigma que lhes foi atribuído ao longo das décadas, um pouco como se diz na sabedoria popular, “Paga o justo pelo pecador”, estigma esse que se verifica devido ao crescimento rápido e desordenado que se verificou em Armação de Pêra e na orla marítima algarvia em geral no período imediatamente posterior à criação do Hotel Garbe.

A necessidade de preservação e divulgação deste património “contemporâneo” tem, a meu ver, que assentar em duas premissas, o primeiro, interpretar esta e outras obras como símbolos de uma época, do advento da abertura da nossa orla marítima ao turismo de massas e consequente modernização (para o bem e para o mal…) e claro está pela qualidade do conceito e da arquitectura, contrariamente a muitas obras que se verificaram na expansão dos núcleos urbanos costeiros onde qualquer parâmetro imposto foi certamente ignorado.

Olhando para o edifício original, ou mesmo depois da ampliação projectada por Jorge Chaves em 1973 verificamos um edifício moderno que apesar da sua grande dimensão, aposta essencialmente na horizontalidade (e não na construção em altura) e no jogo de volumes existente no bloco, como por exemplo os vãos de escada salientes do edifício ou as varandas.

Não sendo apologista das construções sobre falésia por todas as razões conhecidas, é necessário confrontar os conhecimentos actuais com os de finais da década de cinquenta/início de sessenta no que toca a preocupações ambientais, e entender também que estas obras forma realizadas numa conjuntura muito específica que aos nossos olhos pode ser questionável, e de preferência evitável na realização de novos projectos, mas que na altura eram símbolo de uma desejada abertura de Portugal e da nossa região ao mundo.

O Hotel Garbe é tido como um dos projectos referência para a primeira vaga hoteleira no Algarve e pioneiro no nosso concelho, surgindo deste modo referido em inúmeros estudos sobre a arquitectura balnear em Portugal, mas carece de um estudo mais aprofundado que poderia servir para dar a conhecer aos interessados o projecto original, e também as alterações que foram efectuadas nestes 50 anos de forma que se mantivesse ao longo das décadas adequado à crescente exigência dos parâmetros de qualidade impostos às estruturas hoteleiras.

Referências Bibliográficas

Fernandes, José Manuel, Janeiro, Ana. (2005)

Arquitectura no Algarve, dos primórdios à actualidade, uma leitura de síntese

Faro: Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve


Lobo, Susana (2007)

A colonização da linha de costa: da marginal ao "resort" in

Jornal de arquitectos nº. 227 (Abril-Junho 2007), Lisboa. Pp. 18-25

Fonte da imagem: Acervo fotográfico do IHRU.

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